quinta-feira, 24 de setembro de 2015

1º dia- de Caprese MIchelangelo a Sansepolcro.


Amanheceu nosso primeiro dia de caminhada.A sensação de despertar no horário correspondente a 1.30 da manhã no Brasil não foi digamos normal, assim acordei meio "fora do prumo" mesmo tendo dormido por longas nove horas.
Mas estávamos alí para isso mesmo: levantar cedo, arrumar a mochila e caminhar. Seriam 28 km até Sansepolcro. 

Arrumamos as mochilas- a minha com pouco peso- pois o restante seria transportado pelo táxi contratado. O café foi servido com pontualidade às 06.30 h e foi bem aproveitado com o famoso presunto italiano, os queijos sensacionais, croissants, leite e café.

Fizemos as despedidas e saímos descendo a rua margeando a casa de Michelangelo, passando pela casa dos carabinieri, a igreja e logo o à frente a rodovia asfaltada, sentido nordeste, conforme apontava minha bússola.

No começo longa descida e, como era o primeiro dia, estava visível o entusiamo da turma. Em fila indiana, com nossa guia  Cristina à frente, fomos percorrendo a estrada ladeada por muitas árvores. À nossa esquerda iam ficando para trás a imagem e as medievais construções do bucólico vilarejo.

Logo á frente saímos do asfalto e pegamos uma estrada de terra que mal cabia uma carroça, mas de piso firme.

Mais uns quilômetros andados tivemos que escalar e descer uma grande trilha, íngreme e bruta escavada pela chuva, que corria por baixo de uma linha de transmissão de energia.


Tivemos muito cuidado em transpor esse local, pois qualquer deslize e um tornozelo torcido poderia comprometer o restante do dia. 
Observei que  as montanhas ao redor eram como que as bordas de um imenso prato. Caminharíamos ao longo dos dias por esse imensa borda, com o vale ao centro.

                                 Estas belas coníferas estão prentes em todo o caminho

                                         
                                      Torre de observação de incêndio


 
Intercalando asfalto e terra, caminhamos por bom período até que por volta de 12 horas paramos sob um grande arvoredo para saciar a fome e descanso.


Reiniciarmos a caminhada descendo  a trilha até o asfalto para Sansepolcro e dali passamos a caminhar no belo vale do Tevere. Trata-se de grande planície, com campos cultivados e muitas áreas já preparadas  esperando certamente melhor época para o plantio.Notamos que a maioria dos riachos estava com pouca água e muitos deles completamente secos. Alí, como no Brasil, a falta de chuvas estava castigando os agricultores.

A economia daquela região da Toscana pode ser observada pelas variadas máquinas agrícolas presentes e seus usuários em labuta sob o forte sol.Pessoas que pareciam ser os próprios donos da terra debruçavam-se sob o solo como que analisando as possíveis correções a serem feitas antes de um imediato plantio.






                             
Pelo meio da jornada, sob um sol bastante quente, cruzamos uma ponte sobre um grande lago,e logo a seguir dobramos à direita numa forte subida passando por pequenas propriedades rurais, mais parecendo  sítios de lazer e num deles fomos aquinhoados pela proprietária com fresca água para nossos cantís.


                                                           
banco em ferro fundido, cm desenhos em relevo na entrada do sítio.   


Outra observação que fiz foi a constante presença de grandes blocos de "feno" nos campos, devidamente enrolados e secos, prontos para uso. Acredito serem destinados à venda pois a presença de gado bovino na região é ínfima, pois em todo trajeto vimos pouquíssimos bovinos.
  


Alem disso, as laterais da estrada percorrida são sombreadas por imensos arbustos carregados de flores de uma espécie bonita e perfumada, tendo ao lado, campos com uma vegetação baixa e uniforme.

Neste local numa imensa reta, vi pela primeira vez um campo de papoulas ao lado de imensos trigais. Uma outra plantinha rasteira que observei e depois fui pesquisar chama-se "guado"(foto abaixo) e é um multisecular cultivo de onde se extraiam uma tinta que dava tonalidades do verde ao azulado. Essa industria de tintas já estava presente na região desdo os anos 1300.No começo do século vinte foi substituída pelos corantes industriais, bem como pelo cultivo da amoreira, para a criação do "bicho da seda."

                               File:Isatis tinctoria Sturm28.jpg 
Ao final da grande e interminável reta, chegamos ao asfalto que dava acesso a medieval cidade de Sansepolcro e antes dela, cruzamos com essa cidadela(abaixo) também medieval, localizada no alto de uma colina, cena típica das cidades de antigamente, construídas no alto para se protegerem dos inimigos.


Na entrada para Sansepolcro, no cruzamento de duas rodovias, paramos num movimentado posto de gasolina para descansar e saborear umas cervejas, já que o calor estava forte e a cidade estava dali a uns dois quilômetros. Picolés e sucos também foram avidamente consumidos. Uns 20 minutos de descanso foram suficientes e então prosseguimos pela lateral da movimentada estrada até alcançarmos a entrada da cidade. 


Foram 28 quilometros percorridos em 8 horas por um belo trajeto da provinicia de Arezzo,na Toscana. Sansepolcro( 16 mil habitantes), antigamente Borgo del Santo Sepolcro, estava ali, com sua grande e famosa Porta Fiorentina nos esperando para uma foto fundamental.






Adentramos a secular e intra-muros cidadela observando as pessoas e suas edificações rumo ao Albergo Fiorentino, localizado nas imediações. A rua por onde entramos- e por consequência as demais-é típica dos filmes de época que assistíamos quando mais novos -estreita e meio tortuosa, mas absolutamente limpa e bem cuidada.

Alguns veículos e muitas bicicletas circulavam pelo local. Um leve burburinho ouvia-se por entremeio as casas e lojas.Coisa de italianos em franca e acalorada discussão.


No Albergo encontramos uma simpática hospedagem, onde um italiano de nome brasileiro Adelson, atendeu-nos  em perfeito português, pois morou por três anos em São Paulo. Cada dupla foi para seu quarto e após um reconfortante banho saimos para conhecer a incrível cidadela. 
                                                                

Os amigos foram por aqui e alí conhecer o lugar,  enquanto eu fiquei absorto em meus pensamentos sentado numa elegante cafeteria tomando uma cerveja, apreciando o movimento e raciocinando sobre a minha dor lombar.Minha carga da mochila não estava devidamente de acordo com o ideal e uma leve dor me incomodava.
                     

Nesses momentos pensei em muita coisa: meus familiares tão longe no Brasil e eu ali numa cidade longínqua no meio da Itália,na sensação agradável de estar vivenciando um momento nunca avaliado antes: como poderia eu pensar que em algum dia da vida estaria em Sansepolcro, que nunca havia ouvido falar, olhando aquelas construções seculares e pensando o quão difícil teria sido a vida para os habitantes da época que, sem energia elétrica, água encanada, sem sistema de esgoto, as doenças, como tiveram que se virar para fazer as refeições do dia a dia, o sistema de ensino, o medo da autoridade estabelecida, a vida fora dos muros da cidade, o sistema de distribuição e compra de alimentos,enfim.. devem ter passado por muitas dificuldades na vida. 

Passados uns trinta minutos, terminei a segunda cerveja, peguei minha câmera e fui fotografar alguns dos mais belos monumentos do local, uma vez que o tempo era curto e não daria mesmo para ver tudo. 


Não há como colocar nesse simples relato, todas as fotos de uma cidade histórica como essa. Seria necessário um "book" para retratar todos o monumentos, igrejas, edificações, museus, etc. Como isso é absolutamente impossível me limito a colocar algumas fotos mais interessantes e personagens marcantes da cidadela.

Os mais interessantes são o  Museu Cívico de Sansepolcro, Museu della Resistenza, a Chiesa de Sanfrancesco,a de  Sant'Antonio Abate
Sansepolcro-San Francesco.jpg      Sansepolcro-Antonio Abate.jpg

                                   


Acima o "Paradiso dei Capuccini", de Paolo Piazza(1508) na Igreja de San Michele Arcangelo.


Das coisas que mais me atraíram nesse périplo medieval italiano, destaco os portais das igrejas, as portas em geral ,as janelas, os brazões e as aldravas das portas. As igrejas em si são um caso especialíssimo à parte, tal a beleza estrutural com que foram construídas e adornadas com imagens, afrescos, esculturas,etc.                             
Também pudera, o Renascentismo foi o período mais rico da história da cultura ocidental e se deu todo na Itália, onde mestres famosos nasceram e lá implantaram suas obras primas.

   

                        Em todas as portas existem belas aldravas como essa



A estátua abaixo é de Luca Pacioli, frade franciscano, matemático e economista que foi colaborador de Michelangelo. Publicou  a "Summa De Arithmética, Geometria, Proportioni e Proportionalitá e della Divinna Proportionie, demonstrando toda sua capacidade intelectual.

                                            

            
           

          





Ao final do dia, visitados os mais diversos monumentos históricos possíveis, voltei ao albergo para encontrar os amigos e prepararmos para o jantar, num restaurante ao lado do Fiorentino. Como se tornaria hábito, veio o antipasti, o primo e o secondo.Tomamos vinho para comemorarmos o primeiro dia de caminho e voltamos para dormir.

Dormi confortavelmente, entretanto acordando de madrugada pela dor na lombar, motivada também pelo colchão mais macio que precisava.
Ali, na hora mesmo, resolvi que não caminharia no dia seguinte para preservar a coluna para os dias seguintes.


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