quinta-feira, 24 de setembro de 2015

10º dia- Spello- Foligno -Trevi- 22 km

Começamos a caminhada do décimo dia, ás 7.30 h com sol brilhante, céu claro e um suave ar frio que me obrigou a usar um  agasalho. Coisa rápida que o caminhar ritmado  por uns meros trinta minutos  logo obriga- te a se desfazer dele.

Na nossa frente  aquela grande planície do imenso vale,  que sempre foi objeto de nossa visão desde Assis. De fato, caminhando sempre na crista da montanha do vale da Umbria, a planície esteve sempre ao alcance da vista e das lentes das câmeras.

Para trás ficou Spello, encantadora idade medieval, simbolo de uma era que não volta, mas que mantém-se através da tradição e cultura de um  povo. Gostaria de ter ficado mais um dia ali para conhecer melhor.

No trajeto da saída, percorremos de novo algumas ruelas estreitas da cidadela, passando por uma das citadas portas medievais e alcançando a estrada asfaltada, ladeada por extensas lavouras de trigo.

Estávamos a caminho de Foligno, uma cidade maior a meio caminho para Trevi, nosso destino de hoje. No dia anterior, antes da chegada a Spello, lá no alto da montanha, Cristina havia apontado ao longe e disse: "lá está Trevi, nosso pouso de depois de amanhã". Olhei para o infinito e calculei: em linha reta deve dar uns 50 quilômetros! Longe mesmo e provavelmente não devo ter errado. 

A atividade agrícola da região é intensa, o que pôde ser comprovado pelos vários campos cultivados, a presença de máquinas agrícolas e os já conhecidos rolos de feno. Interessante que até agora não vimos rebanhos bovinos ou equinos que justificassem tanto feno. Logo deduzo que os mesmos são vendidos para outras regiões de pecuária mais intensa.

Papoulas isoladas encontramos no meio dos trigais, e eu que nunca havia visto papoulas fiquei encantado com suas cores.

Uma ou outra capelinha, perdida no meio dos campos estava lá presente, como que para confirmar o já conhecido lado  católico dos italianos.

                                     







Agora estávamos percorrendo um trecho mais populoso com pequenas propriedades rurais. Muitas casas com carros nas garagens. Notamos também a presença de muitas motos e bicicletas.

Vinte e dois km em linha reta e no plano, são facilmente percorridos por quem está acostumado e com umas poucas horas cruzamos uma movimentada auto-estrada, passando sob ela por um estreito túnel. Na nossa frente ainda muitas casas e o largo horizonte apontava para Foligno, que não tardou a ser alcançada. 

Foligno, com cerca de 56 mil habitantes, é um importante entroncamento rodo-ferroviário, possuindo oficinas de reparação dos trens italianos, tendo sido objeto de severos bombardeios na 2ª Guerra Mundial.É uma cidade moderna, com muitas industrias têxteis, metalúrgicas, de açúcar, papel e madeira.

Conserva no entanto importante acervo medieval. Foi fundada pelos umbros provavelmente no século VIII a.C, tendo sido conquistada pelos romanos no ano 295 a.C , recebendo o nome de Fulginiae em homenagem à deusa Fulginia. 

Para mais informações sobre essa cidade abra aqui.

Logo na entrada, os trilhos do trem mostravam que o movimento estaria aumentando, bem como placas de advertência contra algum possível curioso, poderia resultar em alguma dentada canina.

O mapa abaixo evidencia com clareza  o quão  pulverizada está a distribuição populacional dessa região. Com razão cruzamos  com tantos minifundios. 
                                                                             



                                                                 


Já dentro da cidadela,atravessamos a ponte sobre o  belo rio Topino, que nasce nos Apeninos e  alcançamos o centro histórico .

Logo percebi a a presença de muitas bicicletas, motos e scooters. O nosso grupo, trajando camisas alaranjadas, certamente causou algum espanto nos habitantes locais, pois diversas vezes flagrei uns cochichando com os outros apontando para aquele bando portando mochilas e cajados.

                                              
Uma das coisas mais marcantes em todos os trajetos percorridos é a presença maciça de placas indicativas de tudo quanto é possível. Falta de informações direcionais não pode servir de desculpa para quem, eventualmente se perder naquelas cidades.

Passamos rapidamente pela belíssima igreja de São Feliciano, erigida em 1291, onde uma missa estava sendo rezada naquele momento. Eu e  alguns colegas, entramos para breve momento de orações, contemplando a rica ornamentação de quadros, afrescos e imagens.



                                                    


                          




Foligno mereceu nossa pausa para descanso, alimentação  e fotografias, tal a quantidade de monumentos e pela beleza plástica de suas históricas edificações. 

                                             

                                            Piazza della República

                                                                  Uma Raleigh inglesa

Paramos na grande Piazza dela República,onde se encontram, dentre outros, o Palazzo Comunalle, o Palazzo Podestá  e o Palazzo dei Trinci.  

Ainda aí está a espetacular fábrica do Duomo, construído em 1133. De grande fama também é a Piazza Grande, onde Francisco se desnudou e ali renunciou a seus víveres.                          



                                  
Naquele dia, uma quinta feira, era grande o movimento de turistas, principalmente ciclistas. Ainda não era hora do almoço mas alguns restaurantes já exalavam  no ar um cheiro atrativo dos temperos. Algumas lojas ainda estavam fechadas e muitos tomavam sol sentados pelas escadas dos monumentos.                  

Numa cafeteria da Piazza alguns colegas não resistiram aos capuccinos e chocolates quentes e eu me dirigi a uma farmácia para comparar alguns cerottis, os eficientes adesivos que aliviam qualquer dor.
Outros se aventuraram pelos deliciosos gelatti, famosos em qualquer parte do mundo.
                                 



Eu me desloquei pelas imediações fotografando o que estava ao alcance, os monumentos históricos e as lojas de artigos para ciclistas ou ainda material esportivo para treino ou montanhismo. Muitas lojinhas de artigos turísticos estão espalhadas pelas ruas adjacentes. O preço dos artigos estava proibitivo em razão da desvalorização do real frente ao euro, entretanto uns alforges para bicicleta me animaram.




Mas lamentavelmente,nosso tempo de estadia ali em Foligno não podia ser prolongado pois teríamos que pegar a estrada de novo rumo a Trevi.

Assim, após esse descanso cultural por assim dizer, retomamos o caminho, passando por uma estação de trens  e tomando a estrada já movimentada aquela hora. As ruas de Foligno são charmosas e como em todas cidades encontradas, muito arborizadas.






Nossa jornada prosseguiu por entre extensos vinhedos e olivais , debaixo do forte sol do meio dia. Uma trilha a seguir deu a ligeira impressão de alívio do calor, mas que nada, continuava quente e seguimos  passando por pequenas capelas e comunidades isoladas, com poucas pessoas à vista.

Descendo depois dessa trilha, cruzamos outra rodovia asfaltada e logo á frente o alívio que todos queriam... um boteco: o único até agora, ao lado de um supermercado. Fomos até lá e para nossa sorte, os proprietários se prontificaram a nos atender pois logo depois iriam fechar. 
Tomamos cervejas, sucos e fizemos um breve lanche.








Ao longe, entremeio aos vinhedos, podia ser avistada a cidade de Trevi, mas ainda tivemos que atravessar os intermináveis olivais. 
Veja aqui filme sobre a cidade de Trevi.

Aliás eu nunca tinha visto uma lavoura de oliveira. Me pareceram uns arbustos sofridos, relegados ao segundo plano por seus donos. São umas arvorezinhas raquíticas, de troncos tortuosos e parecendo estar sempre a pedir água.
Não faço ideia de  período de colheita e coo ela se dá. Imagino a dificuldade pois a maioria dos olivais está assentada nas encostas das montanhas, inviabilizando a colheita mecânica.

A mão de obra na Itália é  muito cara e assim fiquei imaginando quem colhe as azeitonas. O fato é que elas estão lá desde os primórdios da era cristã.

Todos nós sabemos que o azeite italiano, seja a fruta  colhida da forma que for, é de excelente qualidade, mundialmente famoso  e nós abusamos dessa iguaria em todas nossas refeições.

Seguimos em frente e depois de atravessarmos uma pequena comunidade avistarmos as torres da cidade, encarapitada no alto de uma colina, como que olhando e apreciando a beleza do grande vale. Era assim o sistema de defesa na idade média: ser construída no alto e cercada por altos muros.


Seguimos por trecho asfaltao, entramos na cidadela e dali alcançamos o excelente  "Ristorante e Albergo Il Terziere", uma casa confortável, clara, iluminada, com jardins e piscina, possuindo exatamente aquilo que um andarilho precisa ao chegar ao seu destino.

Cada qual se alojou no seu quarto e fiz um rápido reconhecimento do local: agradabilíssimo, com sala de refeição aconchegante, mesas com toalhas de qualidade, os pratos e talheres devidamente ajustados. Uma beleza. 

                          
                                                    






Enquanto uns lavavam roupas, fiquei ali descansando e apreciando um bom vinho, enquanto pensava no dia a dia de nossas caminhadas e tambem rascunhar as anotações do dia. Já descansado, fui dar um passeio pelos arredores, procurando descobrir as belezas dessa também antiga cidade medieval de 7.700 habitantes.

Trevi, fundada pelos romanos,foi uma importante comuna ao logo da via Flaminia. Com a queda do império romano, a cidade foi sendo cristianizada pelo bispo Emilianio. Foi depois ocupada pelos longobardos e incluida no Ducado de Spoletto. 

Durante a idade média, Trevi foi administrada por  Foligno e Spoleto.
Sua deficiencia militar e administrativa continuou até o sec. XVI. Após longa administração por vários lordes ( Trinci, Michelotti, Sforza) Trevi tornou-se parte do Estado Papal e permaneceu sob sua dominação, exceto no curto período de Napoleão Bonaparte, até 1860.

Embora pequena, a cidade não decepciona aqueles amantes das artes e história antiga, com seus casarios e ruelas bem ao estilo medieval. As casas, sim as casas! Enfeitadas e desalinhadas a seu modo, são, de toda sorte, o retrato da época. Muitas flores e vasos a enfeitá-las.
                                                                             Il Borgho


                                          Porta da Igreja de San Francesco

O jantar foi servido mais tarde e como de costume foi a tradicional massa, cujo sabor já não mais discuto, mas que meu pensamento sempre esteve à procura de um feijão maravilha, com arroz e um belo bife acebolado. Bom sono essa noite.    

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Postagem em destaque

O Caminho de Assis- Itália

O Caminho de Assis, uma viagem pela Idade Média na Itália O homem medieval é o "homo viator ". Sua vida é um caminho percorri...