sexta-feira, 27 de abril de 2012

Freguesia da Vila Nova de Almeida- II

Em 14 de julho de 1880, chegava o Bispo Lacerda à cidade de Serra (São José do Queimado) e diz que "todo aquele numeroso povo se ajoelhava para cantar o Bendito em bela solfa, semelhante à de Vitória" numa clara referencia que estivera antes em Vitória, o que não está no livo.
Sua atuação nas localidades por onde andou, consistia em aplicar catequese, pregar, ouvir confissões,celebrações de missas, crismas, batizados, casamentos,comunhões, ofícios, reuniões,cuidados com os doentes,etc bem como os trabalhos burocráticos para com a Igreja tais como conceder indulgência, benzer pessoas,objetos,cemitérios, rezar em público e privado,encomendar os mortos, dar extrema-unção, alem de registrar tudo em relatório .
Fez uma verdadeira assistencia espiritual em massa, buscando suprir a costumeira falta de padres.
São constantes as reclamações do bispo acerca dos trabalhos que a burocracia da Igreja e seu próprio zelo apostólico lhe impõem.
E tem que cortar na própria carne, arrostando o concubinato dos padres...
Mas estes não eram grandes problemas.Sua verdadeira cruzada contra os protestantes e maçons, a mancebia, lhe valem permanentes dissabores. Em relação à maçonaria nunca abre a guarda...um exemplo  consta no dito relatório da visita pastoral de 1886-1887: "Soube que alguns Maçons (poucos) desta Vila (Itapemirim), alguns aliás sisudos,tinham resolvido abster-se de ser Padrinhos, devido isso em parte a Monsenhor Amorim e em parte talvez à notícia do que houve  na visita da Vitória em 1880". Realmente Christiano W.Fraga reproduz ou cita longos pronunciamentos e representações de membros da loja Maçônica União e Progresso de Vitória - ( fundada em 1872,fotos abaixo)

 


contra declarações e medidas hostís do prelado, durante sua visita pastoral.Os maçons não gostavam dele mesmo!
Na década de 1880, o mundo transita da era do capital para a era dos impérios,como explicam os dois livros de E.Hobsbawm, que possuem este título. 
A Inglaterra era a rainha dos mares e senhora das terras.
Quando dessas visitas às terras capixabas, o regime monárquico no Brasil encontra-se decadente, pressionado por problemas políticos, por uma crise monetário-financeira -que aumenta com a libertação dos escravos - e pelos ideais republicanos e abolicionistas.
Nos anos 1880, malgrada a grande depressão por que passa a economia mundial, o comercio do café trás certa prosperidade para o Brasil e para a província capixaba.
Na sua visita a Cachoeiro do Itapemirim D.Lacerda ouve os primeiros apitos de trem em terras capixabas e tem uma reação típica de ultramontano desconfiado e até descrente com o progresso:
   - " Nesta Freguesia, trata-se de começar uma estrada de ferro e já se inauguraram os trabalhos a 6 de janeiro(de 1886) e veio até o Presidente da Provincia .. Eu não fui ver. Dizem alguns que será a morte desta Vila, não porém de seus fazendeiros. Não é comigo".
Antigo professor de geografia em Mariana-MG, D.Lacerda se esforça para estabelecer um mapa da presença católica nas partes da diocese que visita.
Descreve as vilas e povoados percorridos e a natureza circundante. E para cumprir com uma obrigação sua, não se esquece de observar os acidentes naturais e contemplar as belezas da terra, reiteradas vezes registradas com admiração. 
Preocupa-se com a destruição do meio ambiente natural e nisso sua postura é atualíssima e tem o cuidado de registrar manifestações e costumes  religiosos, civís e oficiais.
D. Lacerda fornece indícios sobre a composição  de grupos sociais, as funções das autoridades e até tendencias políticas dos capixabas daquela época. Os usos e costumes que hoje são objeto de pesquisa e estudo do folclore, os nomes antigos dos locais(uns ainda se conservam, outros se perderam no tempo) constituem, do mesmo modo, fortes referencias para os pesquisadores. 
Sem contar os acidentes naturais( rios ainda sem nome e cursos em discussão) que tenta localizar e comentar, sempre comparando com as cartas geográficas que tem à vista e nas quais aponta muitos erros. Fornece notícias sobre  a proveniência de pessoas de Minas Gerais e do Rio; portanto esses relatórios servem tanto à história capixaba quanto  à de outros lugares.
Fala sobre os pioneiros de Piuma e Alfredo Chaves, descreve as casas dos colonos e sua situação financeira. Nos diversos territórios que pertenceram à grande Colônia do Rio Novo, já então extinta, indica as sessões coloniais com nomes femininos-Virgínia, Matilde, Carolina,Alexandrina.
Na questão dos limites com Minas Gerais,suas observações, favoráveis aos capixabas, documentam a expansão mineira rumo ao leste na região do antigo Quartel e Vila do Principe. E transcreve registros diversos( a maioria casamentos) do século XVIII constantes em livros eclesiásticos de Guarapari, que provavelmente não mais existem, com informações que podem servir de pistas para pesquisadores de vários temas.
Demonstra grande admiração por José de Anchieta, de quem já menciona a existencia até observações de imagem. Em certos trechos ressalta a figura do jesuita e registra  os esforços para reformar  a cela junto a Matriz de Assunção, na então Vila do Benevente, local em que se acredita ele tenhoa morrido.
Do seu ponto de vista, depara-se com uma população cheia de crendices, superstições, de relaxamento nas práticas religiosas pela falta de padres ou, pelo que mais teme, pela presença de sacerdotes não sujeitos á sua autoridade ou aos ideais que comunga. Com veemencia semelhante com que investe contra os maçons, ataca certos padres italianos por considerá-los inadequados à missão da igreja.
Em certo sentido o bispo Lacerda é um viajante que passa  pela provincia com um olhar "estrangeiro", considerada sua formação lazarista  e romanizada. Mas sua alma é brasileira e sente-se à vontade  na divisa Minas-Santo, por estar perto da realidade que conhece tão bem.
Estamos em  18 de agosto de 1880 e o Bispo Lacerda  chegou á Freguesia dos Santos Reis Magos da Vila Nova de Almeida, pomposo nome para o que hoje chamamos de "Nova Almeida".Veja aqui
No momento de sua chegada, estava formada na praia uma procissão, com duas fileiras quase que só de mulheres e meninos da escola e todos de mãos postas, diga-se de passagem.
Quando  apeou do cavalo as meninas lançaram flores sobre ele e a banda de música de Almeida tocou sua marcha, sem importar-se com a da Serra que começara a tocar desde que se teve vista da procissão( o que gerou ciúmes dos Almeidenses) sendo saudado pelo Presidente da Cãmara Municipal José da Rocha Coutinho Soeiro, que leu um discurso cheio de respeito e sentimentos católicos.
O Bispo respondeu agradecendo a uns e outros, serranos e almeidenses, dizendo que tantas demonstrações de veneração e amor serviam de lenitivo às saudades que trazia da Serra, sem porém apagá-las.
Dalí eles subiram uma extensa estrada sem casas, em ladeira desde o Porto até o alto em que está a Matriz e a maior parte da Vila.
D. Lacerda anota que a praça é vastíssima, quadrilátera, abrigando praticamente toda a povoação. Do alto avista-se a foz do(hoje)  Rio Reis Magos e a imensidão do oceano.
Está ele agora dentro da Matriz dos grandes padres jesuitas, ao som dos sinos e foguetes. Houve orações de costume, depois o Confíteor e Indulgencias e diz sentir uma vibração lembrando-se que alí estivera Pe. José de Anchieta  séculos atrás, pregando para uma plateia de indios. Houve ainda água benta e incenso e entoou-se o Te Deum.
veja aqui sobre a Igreja
Dos  índios presentes, uns seis estão lá com suas guararás(tambores), cassacos(paus dentados) e massacás(chocalhos)  soltando suas lúgubres e  monótonas vozes sem modulação alguma.
D. Lacerda  dirigiu-se, após a cerimonia, para a Casa da Camara, antiga casa dos Jesuitas,quase toda em ruinas mas que fora caiada na sua frente assim como a sala das Sessões e o quartinho onde ficaria para dormir.Serviria para seu abrigo no tempo que lá ficou.
Jantaram na casa do Vigário na companhia do Comendador Mercier ao som da banda de música da Serra para ciume dos almeidenses,que os seguiram pela praça, tocando e soltando foguetes.

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